Passo por ela na portaria de serviço do prédio, ela está terminando de fumar um cigarro. Alguns detalhes visíveis e a idade me fazem concluir que sua história, cheia de altos e baixos, teve mais momentos tristes...
Não a cumprimento, eu evito pessoas e seus olhares, julgamentos, falsos sorrisos. Não é medo de me machucar com suas reações sociais ditas normais - nunca fui de saber como me comportar direito em cada situação mesmo. É o inverso que me incomoda...
Cheguei no elevador e ele não estava ali, aflito apertei mais de uma vez o botão. Não acelera o elefante de metal, mas me faz sentir que tenho algum controle e talvez possa evitar acontecimentos desnecessários...
Tarde demais, a moça volta de seu momento relaxante. O cigarro havia terminado, de volta à realidade. Dá boa noite, eu murmuro qualquer coisa de volta que se entende como equivalente à um aceno gentil. Seguro a porta para ela passar, entro e aperto o botão do meu andar.
O fone de ouvido, a minha cara de impassível não foram suficientes ... ela precisava desabafar, exclamar. E que situação melhor falar com um desconhecido que nunca te vira antes, em um prédio onde as pessoas não se importam com ninguém? Começou:
- O cigarro... - e fez uma pausa dramática pra assegurar que eu estava preso na sua rede de atenção.
Eu tirei um dos lados do fone e olhei para ela. Ela tinha passado pelo meu teste inicial, se vai valer a pena ou não ouvir as pessoas. Quando elas querem muito e precisam, não há etiqueta social, cara de poucos amigos, impessoalidade e fones de ouvido que as controlem... elas desabafam, elas precisam disso. Então, ela continuou ao me ver esperar na porta do elevador, já aberta e impedida de fechar por mim:
- Eu já tentei parar, mas aí sempre acontece alguma coisa...
Eu esperei por mais, aquilo deveria ser o suficiente para ela. Talvez ela só precisasse de alguém para ouvir seu lamento. Aquela noite ela conseguiria dormir, depois daquele instante. Depois de colocar aquela frustração para fora e ter um desconhecido que a ouvira no elevador de serviço do prédio.
Eu olhei seu rosto, estava em paz. A sua feição era de alguém que batalhou bastante e por alguns segundos se deu um respiro, um pequeno alívio...
Poderia ter deixado a porta do elevador correr, a noite dela estava garantida. Mas, eu não gosto de ver as pessoas em paz. Eu não gosto de ser consolo de ninguém, simplesmente porque sei que não importa o que se faça sempre há uma única conclusão e eu falei com todas as letras enquanto a porta corria:
- A vida é uma merda, não sei por que a gente ainda tenta.
E o elevador se foi, aquela mulher se foi junto com ele. Eu virei as costas, e agora sim, eu poderia dormir em paz.
Um comentário:
Eu aqui, agora, sendo essa mulher de 4 anos atrás...
Derramei umas lágrimas,
A vida é uma merda mesmo.
(Mas o conto é bom. Eu publicaria.)
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