quarta-feira, agosto 08, 2012

fora

quando era menino eu roía as unhas
vivia tendo os dedos infeccionados
a mão rejeitava esses agrados dos dentes
não foram feitos um para o outro
mesmo assim eu continuava
era um dos poucos prazeres certos
que eu sentia nesta vida
eu entendo os fumantes
mesmo aquilo me fazendo mal eu seguia
fazendo mal aos dedos infeccionados diga-se
porque eu sentia uma calma ao roê-las
era um passeio pela orla
molhar os pés na praia
e jogar água do mar na nuca

os anos passaram
e o hábito feio parecia grudar mais que cola
e então veio a guitarra, o violão
era preciso deixar de sangrar os dedos
para eles sangrarem nos instrumentos
eu troquei uma paixão por outra
e só quem fica entre dois amores sabe o quê passei
mas aquela quentura antiga continua no peito
fala comigo e pede uma visita
eu dou um aceno e volto pro amor atual
fiel que costumo ser
mas o amor de hoje em dia anda velho e ressequido
e eu pensando em abandoná-lo
meu primeiro ato:
uma unha roída
e lá se vai uma parte da minha vida...

Um comentário:

Snow disse...

Um poema que parece um quadro...
Mas uma obra de arte que arde...
Vc precisa ser publicado.